sábado, 7 de janeiro de 2017

MASH


MASH (1970)

Robert Bernard Altman (20/2/1925, Kansas City, EUA; 20/11/2006, Los Angeles, EUA) foi um dos maiores cineastas norte-americanos de fins do século XX, e um cineasta muito característico.  Conheceu altos e baixos nos favores do público, teve êxitos e insucessos, ganhou Óscares e passou ao lado de outros, dispersou a sua obra por diversos géneros, do drama à comédia, do policial ao musical, mas manteve-se sempre fiel a uma temática e a um estilo muito particular, e muito pessoal. As suas obras evoluíam ao sabor de um puzzle que continuamente se constrói e por vezes se destrói, com dezenas de personagens em histórias aparentemente paralelas que quase sempre convergem no final para um mesmo desfecho. Três dos últimos títulos de Robert Altman, “O Jogador”, nomeado para alguns Oscars de 1992, “Short Cuts - Os Americanos”, retirado de curtas e amargas histórias de Raymond Carver, que triunfou no Festival de Veneza de 1993, que voltaria a nomear Altamn para o melhor realizador de 1993, e “Gosford Park” (2001), várias nomeações e prémios no oscars e nos Globos de Ouro, chamaram, por exemplo, de novo a atenção para a obra deste cineasta, um dos mais interessantes do moderno cinema norte-americano, mas nem por isso dos mais populares junto do grande público, com uma ou outra excepção.
Falando do campo da comédia, Altman, desde MASH, até “A Praire Home Companion - Bastidores da Rádio” (2006) deu-nos alguns títulos indispensáveis, como “Um Casamento” (1978), “O Casal Perfeito” (1979), “Popeye” (1980), entre outros, mas não se pode dizer que seja um autor de comédias, apesar de serem exemplos bastante típicos da carreira de um realizador cuja filmografia se diversifica em direcções contrárias sendo, todavia, possível falar sempre de um estilo próprio e de preocupações particulares. Aliás, qualquer destes filmes, demonstram aspectos essenciais da obra de Altman, atento à realidade circundante, que crítica de forma vigorosa e contundente, mas também irónica e subtil, aprofundando a análise psicológica e as implicações psicanalíticas, quer em termos pessoais, em função das diversas personagens em confronto, quer em termos de um inconsciente colectivo norte-americano, falando dos EUA em termos globais. Digamos que há em Altman um pendor para  a parábola, exprimindo-se esta, no entanto, por formas muito diversas: ou numa via marcadamente realista (vejam-se os casos de “MASH”, “Um Casamento” ou “O  Casal Perfeito”, mas também outros títulos igualmente notáveis, como “Nashville” ou “O Jogador”, que se podem igualmente integrar nesta vertente), ou através de uma simbologia cerrada e críptica, que se esboça em “Três Mulheres” e se prolonga em outras obras como “Aquele Dia Frio no Parque”, “A Sombra do Duplo Amante” e “Quinteto”. 


“MASH” integra-se, pois, nessa vertente metafórica, mas de fundo vincadamente realista, por vezes mesmo hiper-realista, que tem sido o caminho mais fecundo e também o mais original da filmografia deste realizador. Este filme, estreado nos EUA em 1970, iria tornar Altman um cineasta reconhecido internacionalmente, dado o enorme sucesso de público e de crítica que conheceu. Junto da censura portuguesa, porém, a sua sorte seria nula, pois foi proibido integralmente, sendo estreado somente depois de 1974, quatro anos depois do seu lançamento internacional.
Divertida e corrosiva comédia de um humor por vezes retintamente negro, MASH alcançaria o Grande Prémio do Festival de Cannes e várias nomeações para os "Oscars", entre as quais o de Melhor Filme, Melhor Realizador, Melhor Actriz, ganhando o Oscar de Melhor Argumento, atribuído a Ring Larner, Jr, que adaptou ao cinema um romance de Richard Hooker, um médico que cumpriu o seu serviço militar na Coreia, durante a guerra.
O cenário desta comédia é um campo de socorros a feridos (“Mobil Army Surgical Hospital”, donde M.A.S.H.), uma espécie de hospital de campanha, localizado vagamente na Indonésia, durante a guerra da Coreia, mas com os olhos postos obviamente na guerra do Vietname. Aí se encontram as enfermeiras e os médicos americanos que, recrutados pelo exército, cumprem o seu tempo de serviço militar obrigatório. O filme procura demonstrar pelo absurdo o absurdo da guerra. Com fina ironia, por vezes com alguma subtileza, outras entrando abertamente pela caricatura mais contrastada, Altman ataca um pouco por todo o lado, desde a hierarquia militar à incompetência médica, do puritanismo ao espírito vincadamente competitivo do americano médio (veja-se essa admirável sequência do jogo de "rugby"). O próprio machismo é parodiado numa outra sequência notável, a última ceia de um hipotético condenado à impotência, que aceita suicidar-se por não suportar essa ideia. Muito divertida é ainda uma outra situação chave deste filme, uma cena de sexo que, mercê de um traiçoeiro truque, é difundida e ouvida em estereofonia em todo o acampamento.


Altman revela-se um cineasta já de uma excelente fluência na condução do humor e na criação de um ritmo de comédia, jamais gratuita ou inconsequente, sempre inteligente e incisiva para com os poderes constituídos. É conveniente recordar que, em 1970, a América se encontrava num momento de grande contestação à intervenção americana no Vietname, e filmes como “MASH” muito ajudaram a criar esse clima de revolta da consciência colectiva.  Excelentes actores - Donald Sutherland, Elliot Goult, Tom Skerritt, Sally Kelllerman, Robert Duvall, entre outros - ajudam a fazer de “MASH” uma comédia imprescindível, um dos grandes títulos da década de 70.



MASH
Título original: MASH

Realização: Robert Altman (EUA, 1970); Argumento: Ring Lardner, Jr., segundo romance de Richard Hooker; Produção: Ingo Preminger, Leon Ericksen; Fotografia (cor):  Harold E. Stine; Música: Johnny Mandel; Montagem: Danford B. Greene; Direcção artística: Jack Martin Smith e Art Cruickshank; Decoração: Stuart A. Reiss, Walter M. Scott; Maquilhagem: Les Berns, Edith Lindon, Daniel C. Striepeke, Gerry Leetch; Direcção de Produção: Norman A. Cook; Assistentes de realização: Ray Taylor Jr.; Departamento de arte: Sidney H. Greenwood, Robert Lombardi; Som: Bernard Freericks, John D. Stack; Efeitos especiais: Greg C. Jensen; Efeitos visuais: L.B. Abbott, Art Cruickshank; Companhias de produção: Aspen Productions, Ingo Preminger Productions, Twentieth Century Fox Film Corporation; Intérpretes: Donald Sutherland (Hawkeye Pierce), Elliott Gould (Trapper John McIntyre), Tom Skerritt (Duke Forrest), Sally Kellerman ('Hot Lips' O'Houlihan), Robert Duvall (Maj. Frank Burns), Roger Bowen (Cor. Henry Blake), Rene Auberjonois (padre John Mulcahy), David Arkin (Sgt. Major Vollmer), Jo Ann Pflug (Ten. 'Dish'), Gary Burghoff (soldado Radar' O'Reilly), Fred Williamson (Dr. Oliver 'Spearchucker' Jones), Michael Murphy ('Me Lai' Marston), Indus Arthur, Ken Prymus, Bobby Troup, Kim Atwood, Timothy Brown, John Schuck, Dawne Damon, Carl Gottlieb, Tamara Wilcox-Smith, G. Wood, Bud Cort, Danny Goldman, Corey Fischer, Stephen Altman, William Ballard, Buck Buchanan, etc. Duração: 116 minutos; Distribuição em Portugal: Fox; Classificação etária: M/ 12 anos; Data de estreia em Portugal: 17 de Setembro de 1974.

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